Este que lhes escreve fez a seguinte pergunta para o ChatGPT:
“Parlamentares sugerem que a construção de materiais didáticos para uso em salas de aula seja realizada pelo ChatGPT, ao invés de seres humanos, como era comum. Você concorda com essa sugestão?”
A resposta (bastante longa) dada pela inteligência artificial da OpenAI demorou perto de cinco minutos para chegar, e foi cuidadosa e coerente, com esperamos que as máquinas sejam: em resumo, o ChatGPT assumia que usar uma IA poderia auxiliar nessa tarefa, economizando tempo e oferecendo materiais interessantes, mas que não poderia substituir a inteligência afetiva humana, absolutamente necessária em uma área que atende a um campo tão complexo como a Educação e a aprendizagem entre seres humanos, nem responder a conflitos e interpretá-los tão bem como um educador experiente pode fazer.
Ora, o famoso ChatGPT se mostrou muito mais preocupado nessa resposta com a Educação que o governador Tarcísio de Freitas, de quem veio a sugestão de usar a IA em questão na confecção de livros didáticos; não admira, uma vez que, até onde sabemos, o ChatGPT não foi carregado com ideologias e tintas fascistas.
Muito provavelmente o governador e seus fiéis da extrema-direita ignoram redondamente os estudos mais profundos sobre inteligência artificial (e humana também, ao que tudo indica), que revelariam que o que temos de mais avançado nessa área ainda não é capaz de superar a complexidade do cérebro e da mente humana, tampouco imitar com precisão as reações emotivas, afetivas e cognoscentes de pessoas vivas num coletivo (e, ainda que imitasse, não passaria de imitação, discutível mimesis!). Um espaço de aprendizagem é coisa viva, pulsante, que toca mais o caos que a estabilidade, e é justamente nisso que há a riqueza, uma vez que afirmamos que sem conflito não há criação – um espaço desses pacificado “à força” se torna artificializado, pouco vivo, autoritário, menos rico em possibilidades.
Afora essas considerações, que o senhor Tarcísio demonstra desprezar, há a clara e antiga intenção de substituir o educador, sujeito detestado pelo autoritarismo, pois questiona demais, ensina demais, e o braço autoritário quer sempre de menos nesse quesito. O colega sabe muito bem que várias tentativas já foram feitas, e obviamente ainda o são, nessa direção: cronologicamente, digamos assim, tentaram nos substituir por programas de TV, por fitas DVD “didáticas”, por vídeos em plataformas, aulas online, conteúdo pré-gravado online…
Assim, menosprezando, como apreciam as mentes do fascio, o senhor Tarcísio se entusiasma por uma tecnologia que promete economia (se tudo se resumisse a isso, o diálogo seria muito mais sereno!) de verbas e tempo, mas também (coadunando com a práxis da extrema-direita ultraliberal) tira o trabalho de muitos dos construtores de material didático e mais grave, tenta restringir mais uma vez a atuação dos educadores e, por tabela, do estudantes, ao servir tudo pronto e cronometrado, cirurgicamente geométrico, de modo a não exigir a intervenção (jamais!) de uns e de outros, uma vez que basta seguir o manual, perfeitamente erigido pela lógica da máquina, limpa, reta, sem curvas, ora, amém!
Não, Tarcísio! Também não será dessa vez que o velho desejo de nos dispensar ganhará corpo, e, a julgar pelo descaso com a Educação e a violência policial, a propósito, que cobre São Paulo, na verdade sugerimos, fazendo coro com a manifestante e seu cartaz viralizado nas redes:
Trocamos o governador Tarcísio pelo ChatGPT!
Alexsandro Sgobin é professor e diretor de educação do Sinpro Campinas e Região