O Brasil perdeu na madrugada deste domingo (1) um de seus maiores intelectuais e cientistas. Rogério Cézar Cerqueira Leite morreu aos 93 anos, deixando um legado que transcende as fronteiras da ciência.

Graduado em engenharia eletrônica pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) em 1958, com doutorado em Física pela Sorbonne em 1962, Cerqueira Leite foi pioneiro em diversos campos científicos. Foi o primeiro no Brasil a utilizar lasers para estudar propriedades de materiais, contribuindo para o avanço da ciência e tecnologia no país.

Cerqueira Leite exerceu carreira acadêmica marcante, lecionando no ITA, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e na Universidade de Paris. Na Unicamp, dirigiu o Instituto de Física e foi o idealizador do Departamento de Física do Estado Sólido. Demonstrando sua visão interdisciplinar, fundou o Departamento de Música e o Instituto de Artes da universidade, deixando sua marca também no campo das humanidades.

Sua trajetória como gestor e cientista não se limitou ao espaço acadêmico. Presidiu o Conselho de Administração do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), que administra laboratórios de ponta como o Sirius, um dos aceleradores de partículas mais avançados do mundo. Criou a primeira incubadora tecnológica do Brasil através da CODETEC e liderou a fundação da Companhia de Desenvolvimento do Polo de Alta Tecnologia de Campinas (Ciatec).

Pensador crítico e militante progressista

Para além de suas contribuições técnicas, Cerqueira Leite foi uma voz ativa nos debates sobre soberania, democracia e ciência no Brasil. Durante a ditadura militar, enfrentou perseguições por suas opiniões progressistas. Em tempos mais recentes, posicionou-se veementemente contra o autoritarismo, criticando o governo Bolsonaro e alertando sobre retrocessos na ciência e na educação.

Em 2016, chamou atenção ao comparar a operação Lava Jato à atuação de justiceiros históricos como Girolamo Savonarola, criticando o autoritarismo do então juiz Sérgio Moro. Sua denúncia de que “não há maior ignomínia que colocar Lula e Bolsonaro no mesmo saco” ecoa até hoje como alerta para o maniqueísmo político e a perda de nuances no debate público.

Cerqueira Leite foi um intelectual com profunda consciência histórica e compromisso com as causas sociais. Foi um patriota no melhor sentido da palavra: defensor incansável da soberania nacional e do desenvolvimento científico como ferramentas de emancipação do povo brasileiro.

Um legado que inspira

Aos 93 anos, Cerqueira Leite deixa um vazio incalculável. Sua vasta produção acadêmica, com milhares de citações em revistas científicas, e sua liderança em instituições de renome internacional, como o CNPEM e a SBPC, garantem que seu nome será lembrado por gerações de cientistas.

Mais que um cientista, Cerqueira Leite foi um farol ético e intelectual, que buscou incansavelmente o progresso humano, a justiça social e a soberania nacional. Sua luta pela ciência e pela democracia permanecerá como inspiração para todos que acreditam em um Brasil mais justo, livre e iluminado pelo conhecimento.

Repercussão

A vida do intelectual foi homenageada por uma série de autoridades e personalidades do país. A ministra da Ciência da Tecnologia, Luciana Santos (PCdoB), avaliou como “inestimável” a contribuição de Cerqueira Leite para o desenvolvimento da ciência no país.

“Rogério Cezar Cerqueira Leite deu uma contribuição inestimável ao desenvolvimento da Ciência, e além de engenheiro e físico notável, foi um ser humano preocupado com o avanço e o progresso coletivo. Me despeço com a lembrança do momento dessa foto, uma noite memorável, ano passado, em sua casa”, publicou a ministra nas redes sociais.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) lamentou a perda. “Rogério Cerqueira Leite foi um dos nossos maiores cientistas e um dos principais responsáveis pelo desenvolvimento da pesquisa e avanços da ciência no Brasil. Engenheiro e físico, contribuiu ensinando, pesquisando e criando departamentos e centros de pesquisa em diversas universidades brasileiras, em especial na Unicamp”, disse, pelo X.

“Foi fundamental para a criação do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais, o CNPEM. Teve forte atuação também na formatação e defesa das políticas para ciência e na defesa da democracia, de um estado forte e a favor da justiça social em nosso país”, escreveu.

Presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Aloizio Mercadante disse sentir “profunda tristeza” com a morte do cientista. “Cerqueira Leite deixa um legado para o desenvolvimento científico nacional, especialmente na Unicamp, onde dirigiu o Instituto de Física e criou o Departamento de Física do Estado Sólido, além de ter implementado o Departamento de Música e o Instituto de Arte”.

“Sem o professor Cerqueira Leite, a ciência brasileira ficará carente de uma figura fundamental, que além da contribuição intelectual, tinha profundo compromisso com a soberania nacional e com a democracia. Neste momento de dor, deixo meu abraço fraterno a todos os familiares, amigos e alunos do professor Rogério Cerqueira Leite”, afirmou.

Com informações do Vermelho

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