No dia 25 de novembro de 2025, o Brasil viveu um acontecimento inédito: pela primeira vez em nossa história, militares de alta patente foram presos para cumprir pena por crimes contra a ordem democrática. Os generais da reserva Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira, assim como o ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos, passaram oficialmente para a condição de condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF), com a confirmação do trânsito em julgado do processo que reconheceu a responsabilidade criminal deles pela participação ativa na tentativa golpista que buscou reverter o resultado legítimo das eleições presidenciais de 2022 e usurpar o poder de forma autoritária.

A este grupo soma-se Walter Braga Netto, general quatro estrelas, ex-ministro da Defesa e ex-ministro da Casa Civil, que em 2022 concorreu à vice-presidência na chapa de Jair Bolsonaro (PL), derrotada por Lula e Alckmin. Em setembro de 2025, Braga Netto já havia sido condenado a 26 anos de prisão por tentativa de golpe de Estado.

Esse fato não pode ser tratado como rotina institucional nem como mero desdobramento processual. Ele representa uma inflexão histórica.

A República brasileira nasceu sob tutela militar, marcada por golpes, intervenções e tentativas reiteradas de limitar o poder civil. Mesmo após 1988, a separação entre o governo eleito e a estrutura militar nunca esteve plenamente consolidada. Sempre pesou sobre nossa democracia o fantasma do pretorianismo: a intervenção abusiva dos militares na vida democrática, seja explícita, seja silenciosa.

A tentativa golpista de 2022 foi o ponto mais recente e mais grave dessa história. Durante o governo de Jair Bolsonaro, setores militares e civis tramaram ações para fragilizar o processo eleitoral, desacreditar a Justiça Eleitoral e fomentar a ruptura institucional. A estratégia incluiu desinformação, sabotagem institucional, uso político das Forças Armadas e estímulo a manifestações antidemocráticas. Não foi improviso: foi projeto.

A condenação desses quatro expoentes militares é, portanto, mais do que uma punição individual. É um marco com pelo menos três significados profundos: verdade, justiça e memória.

Primeiro, o fato do Supremo Tribunal Federal conseguir processar, julgar e responsabilizar figuras outrora intocáveis revela um aprendizado institucional raro em países com histórico de tutela militar. Não estamos diante de uma democracia plena, mas de uma democracia que, aos poucos, está aprendendo a se defender.

Segundo, tentativas de golpe não podem ser tratadas como divergência política ou erro administrativo. São crimes contra a soberania popular. Responsabilizar seus líderes (e não apenas os executores) é condição para quebrar o ciclo histórico de impunidade que, em 1964, custou ao Brasil 21 anos de ditadura.

Terceiro, o ato do dia 25 de novembro não repara o passado sozinho, mas ajuda a construir o futuro. Uma democracia se mantém não apenas por votos, mas também pela memória dos riscos enfrentados e pela coragem de proteger sua integridade institucional.

Se há algo que a história tem tentado ensinar ao Brasil — e que tantas vezes recusamos aprender — é que nenhuma democracia sobrevive quando seus cidadãos passam a tratá-la como garantida. Não é. Democracia exige vigilância, responsabilização e compromisso público com a ideia simples e revolucionária de que o poder pertence à população e não às armas.

No dia 25 de novembro de 2025, a República brasileira respirou. Ainda com cicatrizes, ainda com ameaças, ainda com dúvidas, mas respirou. Que este fato não seja exceção. Que seja início. Porque nenhuma democracia sobrevive quando os que a atacam acreditam estar livres de consequências.

Juliano da Silva Cortinhas é professor da Universidade de Brasília (UNB)

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