O crescente adoecimento mental entre professores da rede estadual voltou a acender o alerta em Campinas. Entre janeiro e setembro de 2025, 3.356 docentes precisaram se afastar por transtornos mentais e comportamentais, conforme dados obtidos pela EPTV, via Lei de Acesso à Informação, junto à Diretoria de Perícias Médicas do Estado. O número corresponde a uma média de 12 afastamentos por dia apenas no município. No estado, o total chega a 25.699 afastamentos no mesmo período.
Os relatos dos profissionais confirmam o que os sindicatos e especialistas vêm denunciando há anos: sobrecarga, condições precárias de trabalho, pressão da gestão, assédio moral, episódios de violência nas escolas, além de remunerações baixas que agravam o cenário de adoecimento. Ainda conforme a reportagem da EPTV, o conjunto desses fatores tem empurrado professores ao limite.
“O médico nem olha na cara e nega o afastamento”, diz representante
Segundo Márcio Calheiras do Nascimento, representante do Centro do Professorado Paulista, o Estado falha em garantir suporte psicossocial adequado e, muitas vezes, coloca barreiras ao reconhecimento do adoecimento:
“Às vezes o professor com problemas sérios precisa de um afastamento e o Estado, inclusive, nega. Eles fazem a perícia pra avaliar a necessidade de afastamento perante o departamento de perícias médicas do Estado. O que eles relatam? Que às vezes o médico nem olha pra cara dele e nega.”
Relatos de adoecimento e pressão da gestão
Uma das professoras entrevistadas, que preferiu não se identificar, contou ter desmaiado na escola antes de descobrir, em setembro, o diagnóstico de burnout. Após um período afastada, foi surpreendida ao retornar: “A gestão da escola me abordou pedindo para eu assinar uma carta solicitando o meu desligamento. Então, eles estavam ali me coagindo a me desligar.”
Ela conseguiu outro emprego, mas relata que as sequelas emocionais permanecem: “Essa sequela emocional é muito grande e não está 100%, porque eu não me ajustei, não tenho um trabalho estável ainda.”
Outra docente, com 22 anos de carreira, teve sua primeira crise de ansiedade quando exercia um cargo de coordenação. A crise veio no banheiro da escola: “Comecei a chorar compulsivamente e precisei ser socorrida por duas colegas. Eu nunca imaginei que pudesse adoecer assim.”
Posteriormente, ela descobriu que o adoecimento estava associado a um caso de assédio moral praticado por um diretor recém-chegado: “Ele me questionava o tempo todo. Todas as vezes que eu tinha crise na escola, ele falava: ‘Você tá desse jeito aí… Mas fez o trabalho que eu te mandei?’ As crises foram piorando por causa disso.”
A professora afirma que o comportamento da gestão era baseado na intimidação, tanto com coordenadores quanto com docentes. E desabafa: “Eu só queria minha qualidade de vida de volta. Queria meu cérebro de volta para ser a professora que eu era antes, mas estou doente, e muitos outros também estão.”
Um cenário que exige resposta do Estado
Os números revelados pela EPTV confirmam aquilo que os educadores vivenciam diariamente: um ambiente de trabalho marcado pela intensificação das cobranças, pela falta de suporte institucional e pela deterioração das condições de ensino.
O Sinpro Campinas e Região reforça que o adoecimento dos profissionais da educação é resultado direto de políticas que desresponsabilizam o Estado e transferem para os trabalhadores o impacto de uma estrutura deficitária. É urgente garantir condições dignas de trabalho, proteção à saúde mental e combate efetivo a todas as formas de assédio e violência nas escolas.
Foto: Appai

