Antes de mais nada, esse breve ensaio não trata do ensino de Matemática, como se percebe logo no título um tanto quanto estranho, mas da riqueza que existe dentro de uma sala de aula durante o período de atividades; contudo, recordemos rapidamente algo da Matemática (pois nem todos somos fluentes nessa decisiva ciência!), para clarificar o que queremos dizer.

Uma equação linear permite prever acontecimentos para uma variável x em função de y: o que significa que a cada mudança em y seguir-se-á uma mudança em x, facilmente encontrada com técnicas já ensinadas em um bom Fundamental II. O gráfico de uma equação linear é uma reta, seja em crescimento aritmético, seja exponencial, portanto, é previsível: às mudanças de uma dada variável espera-se que a variável dependente sofra mudanças acompanhando a magnitude da variável determinante.

As equações não lineares não são assim: a previsibilidade é tremendamente difícil, quando não impossível; podem haver infinitas variáveis, e as resoluções dessas equações são muitíssimo mais complexas que as lineares. Exemplo da aplicação de equações não lineares são o estudo de eventos climáticos, fenômenos econômicos, uma multidão em pânico. Como prever os resultados de eventos como esses, exceto se nos apegarmos a uma (cuidadosa) estatística, citando apenas probabilidades?

Ora, é seguindo essas considerações que dizemos que a sala de aula é “não linear”, imprevisível, com infinitas variáveis que podem ditar – tomemos um só exemplo, mais próximo de nosso trabalho – o nível de sucesso de uma aula planejada com esmero. Vejamos, colega professora, colega professor: qualquer de nós com alguma experiência sabe bastante bem que raríssimas vezes (queríamos dizer “nunca“, mas talvez exageremos aí) uma aula se passa conforme a planejamos em nossa cabeça.

Isso é bastante óbvio e sequer deveria ser aventado, exceto se quisermos nos aprofundar e procurar pontos positivos nisso. E um ponto positivo, conquanto trabalhoso, é a riqueza que um espaço de aprendizagem, por não ser previsível como se espera em geral que seja, pode oferecer. Trabalhoso, pois é preciso estar atento aos acontecimentos, falas, escritas, desenhos, gestos, ideias, mapeando os atalhos, curvas e dissensos que surgem, reveladores de inteligência funcionando. O planejamento “fracassado” talvez não fosse visto assim se nos atentássemos, antes, aos desvios que ele operou, já que um plano desses é proposto para criaturas vivas, cada qual com suas peculiaridades e idiossincrasias.

Mapear a curva que desviou o sacrossanto planejamento, e estudá-la, ao invés de lamentar o fracasso da reta: é possível que tenhamos mais confiança e saúde mental se compreendermos isso.

E é justamente nisso que desde seu nascimento as estruturas da escola “popular” primam em querer falhar miseravelmente, traçando retas exatas e quadrados, condenando as curvas e os polígonos de uma sala de aula viva: como se não bastasse isso, agora vemos borbulhar os “especialistas em educação” da extrema-direita e do fundamentalismo religioso desejando “enquadrar” ainda mais a vida em nossas salas de aula, se possível até o nível do servilismo e da estupidez, ou sendo ignorantes absolutos da condição não linear da vida, ou conhecendo desse fato e desejando controlar, punir, entristecer, amordaçar a riqueza da existência e tornar alunos e alunas marchadores carrancudos, preconceituosos, amargos, inimigos da liberdade, cidadãos mais mortos que vivos.

Colegas, sem pejo, proclamamos guerra à linearidade imposta, celebrando a curva, a complexidade, a celebrações das múltiplas ideias! O poder de uma situação de aprendizagem está nas infinitas possibilidades que dela emergem, e cercear essas possibilidades além de uma ordem salutar (ou, claro, a liberdade pode se tornar licenciosidade), forçando a vida a se ajustar a fórmulas, recipientes e grades é caminho mais curto para o (agora sem ponto positivo algum a se procurar) fracasso, colocando no lugar do ouro da inteligência a extravasar, o chumbo da mediocridade.

Compreendamos a sala de aula viva, com toda a sua complexidade e seus desafios, suas linhas de fuga e explosões de diferença, assim funciona a natureza, assim funcionam as mentes e os corpos – tudo o que nega firmemente isso sem sequer dialogar, é irmão da indiferença, do autoritarismo, da insensibilidade, e da mediocridade imaginada como virtude!

Alexsandro Sgobin é professor e diretor do Sinpro Campinas e Região

Todos os direitos reservados -
SINDICATO DOS PROFESSORES DE CAMPINAS E REGIÃO

Filiado a : CONTEE - FEPESP - CTB